29.2.12

Acção

Repetes a mesma coisa uma e outra vez.
O Rapaz tinha paciência.
Mas esgotou-se.

28.2.12

Palavra

Dizes uma palavra que te era proibida. Afinal existiam territórios que não tinhas o direito de pisar.
O Rapaz fica para sempre calado.

27.2.12

Adolescente

Cometes um erro no final da tua adolescência e assim comprometes uma paixão que não consegues esquecer nunca.
O Rapaz fica para sempre longe.

24.2.12

Trinta e três

Ainda não sei bem qual a distância que os pés devem percorrer para obter o máximo prazer neste mundo. Nem sei bem quais as palavras que abrem portas e fechaduras. Ainda não sei bem o tamanho do amor, muito menos o que significa a imensidão dos mais pequenos sentimentos. No fundo, foram apenas trinta e três anos. Dois passos de criança, um sorriso sincero, uma mão à procura de um lugar onde me amparar. 

23.2.12

Recomeço

Era uma vez um Rapaz que tinha acabado.
E, no dia seguinte, um novo Rapaz aparecia.
Sem respostas para as perguntas.

22.2.12

Fim

E se um dia me vires voar, disse-lhe o Rapaz,
foca o teu olhar no tamanho das minhas asas.

21.2.12

Evasão

Era gente a mais, cabeças a mais, barulho a mais.
O Rapaz, de olhos fechados, no meio de tudo aquilo.
A pensar, apenas, em evasão.

20.2.12

Divisão

Por estes dias, não encontrava o silêncio.
Apenas a divisão.
A umas horas, o Rapaz sabia bem o que queria.
Noutras, apenas queria saber. 

17.2.12

Crianças

Ecoam já as primeiras canções pela rua. Percebe-se a excitação das crianças mesmo dentro das paredes do prédio que, quase inteiro, dorme. A rua enche-se. A festa começa. Algures no mundo substitui-se a tristeza, temporariamente, pela esperança.

16.2.12

Escritor

E depois começaram a confundir o Rapaz com um escritor.
Logo o Rapaz, que nunca escrevera mais de duas frases seguidas, a não ser em composições da quarta classe.

15.2.12

Voz

Reconhecia a voz de algum lado, mas não o olhar.
O Rapaz seguia, pé ante pé, pela noite, descalço.
Era um sonho ou uma qualquer partida do destino?

14.2.12

Máscara

Era de noite, estava frio e na rua corriam uns mascarados.
O Rapaz surpreendia-se, mas não muito.
O mundo é, mesmo, um lugar estranho

13.2.12

Sol

Uma noite inteira acordado e uma hora de sono ao sol
no mesmo lugar de sempre
do autocarro.

10.2.12

Calendário

Passaram os dias, sempre iguais.
Olharam-se as várias páginas do calendário, procurando-se passado e futuro.
O Rapaz está de acordo com os que o dizem banal, igual, desnecessário.
Mas como se tira a vida a um poema?

9.2.12

Encanto

Como um sorriso que apenas se conhecesse de um risco de lápis, o Rapaz entendeu o encanto.
Depois, adormeceu.

8.2.12

Consistência

Certos momentos exigem consistência, como se ao ser humano não bastassem as coisas como elas são, como se fosse necessário um carácter e um peso para cada pormenor da existência.
O Rapaz sabia disso e fugia às evidências.

6.2.12

País

O Rapaz não tinha país.
De noite, viajava por mundos dos quais só ele conhecia as fronteiras.

3.2.12

Final da semana

Sempre que é sexta-feira o Rapaz parece sentir-se mais leve.
É uma ilusão, sussurra-se a si próprio.
À leveza costuma aliar-se todo o peso da semana, em modo cansaço.
As pernas vão leves, rua acima, ao fim do dia, mas a cabeça é já um fardo demasiado para que renasça.

2.2.12

Pequenos e Africanos

Pequenos e Africanos, de vozes frágeis.
Sempre juntos para todas as brincadeiras.
O Rapaz abre a janela e ali estão eles, a preparar alguma.
É preciso saber olhá-los para se aprender a ser pai.

1.2.12

Dor

No primeiro dia da dor, o Rapaz disse que podia aguentar a dor.
Aliás, a dor fizera parte do seu quotidiano desde tenra idade.
No segundo dia da dor, o Rapaz achou que a dor o impedia de ser ele próprio.
Imaginava que a dor poderia ficar para sempre e quase chorava.
Ao terceiro dia, a dor não parecia aliviar.
O Rapaz estava para morrer.
Ao quarto dia, finalmente, a dor começou a desaparecer.
O Rapaz disse que podia aguentar a dor.